quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Rainer Maria Rilke (As elegias de Duíno)

PRIMEIRA ELEGIA (trecho)
Quem se eu gritasse, me ouviria pois entre as ordens Dos anjos?
E dado mesmo que me tomasse
Um deles de repente em seu coração, eu sucumbiria
Ante sua existência mais forte.
Pois o belo não é
Senão o início do terrível, que já a custo suportamos,
E o admiramos tanto porque ele tranqüilamente desdenha
Destruir-nos.
Cada anjo é terrível.
E assim me contenho pois, e reprimo o apelo
De obscuro soluço.
Ah! A quem podemos Recorrer então?
Nem aos anjos nem aos homens,
E os animais sagazes logo percebem
Que não estamos muito seguros
No mundo interpretado.
Resta-nos talvez
Alguma árvore na encosta que diariamente
Possamos rever.
Resta-nos a rua de ontem
E a mimada fidelidade de um hábito,
Que se compraz conosco e assim fica e não nos abandona.
Ó e a noite, a noite, quando o vento cheio dos espaços
Do mundo desgasta-nos o rosto -, para quem ela não é /sempre a desejada, Levemente decepcionante, que para o solitário coração
Se impõe penosamente.
Ela é mais leve para os amantes?
Ah! Eles escondem apenas um com o outro a própria sorte.
Não o sabes ainda?
Atira dos braços o vazio
Para os espaços que respiramos; talvez que os pássaros
Sintam o ar mais vasto num vôo mais íntimo.

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